De S?o Paulo
Na hist?ria daquela cidadezinha, n?o h? registro de algu?m que tenha se dedicado tanto e vivido t?o feliz com sua atividade de trabalho quanto o carteiro Pascoal.
- Ah, mas ele ? sozinho, n?o tem fam?lia, n?o tem filhos, por isso essa dedica??o - diziam uns.
Outros saiam em sua defesa dizendo que, embora homem muito simples, tinha princ?pios de muito valor e vez ou outra, arriscava at? filosofar...
- Ele soube construir seu mundinho e l? aprendeu a ser feliz, acho que ? isso.
- ?... Mas o dia em que ele parar de trabalhar, que Deus me perdoe, acho que ele n?o dura muito - comentou certa vez o Padre Oscar.
Bem, esse dia chegou - o dia da aposentadoria.
Aposentadoria compuls?ria.
Pascoal sentiu o baque, mas guardou pra si o fato.
Sumiu por uns dias; precisava digerir, quieto, sua recente condi??o.
Instalou - se num quarto de hotel, numa cidade pr?xima.
Nos primeiros dias n?o sabia nem mesmo por onde come?ar.
At? que teve um espasmo filos?fico - e justo quando suas id?ias e o c?u amanheceram completamente nebulosos.
- Quem disse que na vida os acontecimentos devem ser lineares? N?o devem, ponto final.
Essa constata??o o levou a uma grande ideia.
- Muito bom... ? isso... Resolvido est?!
Arrumou as malas e voltou para sua cidadezinha, como se nada tivesse acontecido.
A primeira provid?ncia: pegar aquela velha e grande caixa onde guardava seu primeiro uniforme de carteiro, selos antigos, folhetos, comunicados diversos e muitos envelopes em branco.
Coisas que seriam descartadas de qualquer jeito pela empresa, Pascoal, vapt- vupt, pegava pra ele.
Eram essas pequenas coisas que davam estrutura ? sua vida.
A segunda provid?ncia: Pascoal passou a produzir o pr?prio conte?do do seu trabalho; escrevia cartas, selecionava folhetos, envelopava tudo, selava, escolhia o destinat?rio e, devidamente uniformizado, fazia o porta a porta.
Se a popula??o entendeu aquilo ou n?o, n?o importa.
O que importa ? que Pascoal, n?o se deu por vencido e melhor, entre as diversas cartas que passou a escrever, tomou coragem e revelou sua paix?o pela Dona Cec?lia.
- Olha s?, quem diria... Os dois... Nessa idade...
- E n?o ? que formam um belo casal?
- Sem d?vida.
E durante anos, formaram mesmo.
At? que Dona Cec?lia fugiu com outro.
Como ficou o Pascoal?
Sentiu, claro, mas n?o chegou a se abalar.
Dona Cec?lia explicou tudo muito bem explicado.
Por carta.
Victor Romano ? paulistano, tem 48 anos e sempre se dedicou ao desenho; de uns anos pra c?, s?o recorrentes seus del?rios liter?rios.Opini?es expressas aqui s?o de exclusiva responsabilidade do autor e n?o necessariamente est?o de acordo com os par?metros editoriais de Terra Magazine.