Obama segue favorecendo Israel, analisa Nasser


Marcela Rocha

O doutor em direito internacional Salem Nasser avalia, para Terra Magazine, o discurso do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, sobre as fronteiras entre Israel e Palestina. Segundo ele, que ? tamb?m professor da Funda??o Get?lio Vargas e especialista em Oriente M?dio, Israel segue sendo mais favorecido.

- Em principio, essa abertura favorece Israel na medida em que este (Estado) multiplica os assentamentos, criando fatos consumados, e em que ? a parte mais forte nas negocia??es.

O professor d? continuidade ? sua explica??o sobre a manuten??o do discurso pr?-Israel:

- Obama disse igualmente que neste momento n?o ? preciso falar nas quest?es centrais, Jerusal?m e refugiados, enquanto Israel, com cujos interesses n?o deixou de assegurar o seu compromisso, ?, na verdade, quem se recusa a transigir nesses temas. Tamb?m disse que reconhecia o direito de cada Estado de poder defender-se por si s?, mas que, no caso, s? Israel teria esse direito, j? que o Estado palestino deve ser desarmado.

Na opini?o de Nasser, "quando Obama diz que Israel ? ou ser? o Estado judeu para o povo judeu, parece concordar com as demandas e pol?ticas da direita israelense que tendem a tornar cidad?os inferiores - os n?o judeus - em sua pr?pria terra natal e ancestral".

Em longo discurso sobre o Oriente M?dio, proferido nesta quinta-feira (19), o presidente americano afirmou pela primeira vez que as fronteiras entre Israel e um futuro Estado palestino devem se basear nas tra?adas em 1967, "com trocas m?tuas e acertadas de forma que fronteiras seguras e reconhecidas sejam estabelecidas nos dois Estados".

Confira abaixo a ?ntegra da entrevista:

Terra Magazine - Em pronunciamento, Obama afirmou que "As fronteiras de Israel e Palestina deveriam se basear naquelas de 1967, com trocas m?tuas e acertadas de forma que fronteiras seguras e reconhecidas sejam estabelecidas nos dois Estados". Como o senhor qualificaria essa afirma??o? Qual a relev?ncia dela?
Salem Nasser -
N?o h? muito de novo nessa declara??o. O princ?pio de dois Estados, nas fronteiras de 1967, ? objeto de um razo?vel consenso internacional e faz parte do chamado mapa do caminho, base sobre a qual operam, em princ?pio, os componentes do quarteto, e da chamada iniciativa ?rabe. Ainda que se quisesse emprestar a essa men??o mais clara ao princ?pio alguma import?ncia especial, n?o se pode ignorar o que mais foi dito. Obama disse que era favor?vel aos dois Estados e ?s fronteiras de 1967, mas tamb?m disse que haveria trocas acordadas de territ?rio. Quanto do territ?rio ser? objeto de troca, e quais partes, permanece uma quest?o aberta.

A quem essa abertura favorece?
Em principio, essa abertura favorece Israel na medida em que este multiplica os assentamentos, criando fatos consumados, e em que ? a parte mais forte nas negocia??es. Obama disse igualmente que neste momento n?o ? preciso falar nas quest?es centrais, Jerusal?m e refugiados, enquanto Israel, com cujos interesses n?o deixou de assegurar o seu compromisso, ?, na verdade, quem se recusa a transigir nesses temas. Tamb?m disse que reconhecia o direito de cada Estado de poder defender-se por si s?, mas que, no caso, s? Israel teria esse direito, j? que o Estado palestino deve ser desarmado. Quando diz que Israel ? ou ser? o Estado judeu para o povo judeu, parece concordar com as demandas e pol?ticas da direita israelense que tendem a tornar cidad?os inferiores - os n?o judeus - em sua pr?pria terra natal e ancestral.

O que h? de novo no discurso, ent?o?
No conte?do, portanto, n?o h? nada de novo e nenhuma raz?o para grande otimismo. N?o h? d?vida, no entanto, que o discurso quis sinalizar algo de novo, um novo ?nimo, um novo ?mpeto e uma nova energia no chamado caminho da paz. H? um reconhecimento de que a quest?o palestina ? a quest?o central da regi?o e aquela que mais marca a vis?o que t?m e o julgamento que fazem dos Estados Unidos dos mundos ?rabe e mu?ulmano. Mas h? tamb?m a clara limita??o da vontade ou da capacidade para agir decisivamente contra o que ? percebido como interesses de Israel. Faz-se uma declara??o gen?rica contra a ocupa??o e contra os assentamentos, mas joga-se a responsabilidade imediata pelo que vir? sobre as costas dos palestinos, cujo suado acordo nacional ? visto como uma amea?a.
O compromisso com Israel e suas pol?ticas continua inteiro e, portanto, continua inteiro o impasse americano, porque os Estados Unidos n?o conseguem impor a paz que gostariam, aquela que corresponde aos ditames israelenses.

Acredita que ele tenha feito isso para tentar minimizar as consequ?ncias da morte de Bin Laden no mundo isl?mico?
Penso que a declara??o sobre os dois Estados de acordo com as fronteiras de 1967, assim como todo o resto do discurso, tenta responder aos acontecimentos no mundo ?rabe-mu?ulmano e ? nova realidade, ainda em constru??o, que ali se instalar?. A morte de Bin Laden ? apenas um detalhe, quase sem import?ncia, nesse contexto.
Os Estados Unidos s?o um jogador global, no sentido de que ? uma pot?ncia t?o grande e t?o importante que tem interesse no que acontece em qualquer lugar do globo. Porque o pa?s percebe a si mesmo deste modo, tenta influenciar os eventos no mundo e faz?-los corresponder a seu assim chamado interesse nacional. De todos os lugares do mundo em que os Estados Unidos t?m interesses e em que agem para faz?-los avan?ar, o Oriente M?dio, ou melhor, o mundo ?rabe-mu?ulmano n?o ? o menos importante. Ali, como diz Obama em seu discurso, os Estados Unidos t?m interesses econ?micos e estrat?gicos. E ali, como tamb?m reconhece, coisas come?aram a se mexer e a mudar independentemente da vontade americana e, em grande medida, contra essa vontade.

A que veio o discurso?
O discurso ? uma resposta ?s mudan?as, uma resposta que, para ser cr?vel, precisa apagar qualquer sinal de hipocrisia. E nisto, com as palavras, Obama ? muito h?bil. Busca vencer as resist?ncias e angariar credibilidade com o reconhecimento de erros passados (o suporte ?s ditaduras, por exemplo), afirmando valores inquestion?veis, reconhecendo que algumas mudan?as contrariam os interesses mais imediatos de seu pa?s e colocando-se, por assim dizer, do lado certo da hist?ria, afirmando o compromisso, de agora em diante, com a democracia e a liberdade. O fato ?, de todo modo, que os Estados Unidos, como qualquer pa?s, continuar?o a perseguir seus interesses.
O que o discurso faz ? dizer que os Estados Unidos continuar?o a tentar influenciar, sen?o determinar, a agenda da regi?o. Diz tamb?m que, para fazer isto bem, precisam recuperar a sua imagem e articular uma linguagem mais sincronizada com a realidade sobre o terreno. Mas, nas entrelinhas, a l?ngua n?o muda muito.
No que respeita especificamente ? quest?o palestina, para al?m do efeito de cont?gio que as revoltas populares podem ter sobre os territ?rios ocupados e sobre os palestinos em pa?ses vizinhos, Obama tamb?m tem em mente as movimenta??es para a declara??o de um Estado palestino na ONU, em setembro. Ele inclusive menciona isto, de modo n?o expl?cito, em seu discurso. A isto tamb?m, o seu pronunciamento ? uma tentativa, fraca, de antecipa??o e resposta.

O presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, convocou nesta quinta-feira "uma reuni?o urgente" da dire??o palestina ap?s o discurso sobre o Oriente M?dio do presidente americano Barack Obama. O l?der palestino tamb?m agradeceu a Obama pela "aten??o" que mostrou para "o direito dos povos ? autodetermina??o", entre eles o palestino, que "espera e procura a salva??o da ocupa??o israelense". Como o senhor avalia essas primeiras sinaliza??es da autoridade Palestina para os EUA?
Mahmoud Abbas, assim como todos os demais atores interessados, reagir?o, naturalmente, levando em conta o fato de que o discurso do presidente americano ? um fato pol?tico relevante e foi pensado para ser assim. Todos tentar?o ler, por tr?s das palavras, o sentido real do discurso de Obama, ou seja, o que ele realmente quis dizer com isso, e o que o discurso anuncia como inten??o e como poss?vel a??o futura. Tamb?m, todos precisam pensar nas respostas que dar?o a este fato importante. Mahmoud Abbas diz, num primeiro momento, aquilo que aponta para um reconhecimento, contido no discurso de Obama, dos direitos do povo palestino.
Em seguida, e da? a reuni?o urgente, ter? que lidar com a condena??o clara de Obama ao acordo nacional que re?ne Fatah e Hamas. Tamb?m levar? em conta o que o discurso e o comportamento americano que seguir? significar?o para a declara??o anunciada do Estado palestino.

Essa posi??o apresentada por Obama hoje j? era defendida pelo Brasil. O senhor acredita que isso d? mais credibilidade ao Brasil junto ? comunidade internacional?
Defender essa posi??o n?o incrementa a credibilidade de ningu?m, j? que ? a posi??o de consenso. O que me parece diferenciar o Brasil ? a consist?ncia com que tem defendido a posi??o em discurso, mas tamb?m em a??o. Os Estados Unidos e a Europa, ao contr?rio, n?o fazem corresponder suas a??es, ou, mais propriamente, omiss?es, no campo pr?tico, ao que declaram em seus discursos. No pronunciamento de Obama, no entanto, o que parece jogar luz sobre o papel crescente do Brasil ? a men??o expressa ao pa?s como um lugar em que progressos extraordin?rios acontecem.

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