De Salvador (BA)
"Vamos recordar", como dizia Pacheco Filho, nobre e querido animador de r?dio de um dos programas de maior audi?ncia nas tardes baianas dos anos 60. Sucesso retomado por Pacheco d?cadas depois nas tardes de domingo na Radio Metr?pole (a convite de M?rio Kert?sz), at? a morte que calou uma das vozes e nomes mais marcantes da hist?ria radiof?nica da Bahia e do Pa?s.
Em Nova Iorque, h? exatamente uma semana, o franc?s Dominique Strauss-Kahn, chefe do FMI e um dos homens mais poderosos do planeta, foi detido dentro de um avi?o no Aeroporto John F. Kennedy. J? estava instalado na poltrona de Primeira Classe do aparelho da Air France que se preparava para voar at? Paris, no continente europeu, do outro lado do Atl?ntico e, provavelmente, fora do alcance do bra?o da pol?cia e, principalmente, da justi?a americana.
O que se veria a seguir, em vertiginosa e espantosa sucess?o de fatos e imagens de uma das mais espetaculares coberturas de m?dia j? realizadas nos Estados Unidos e na Fran?a - mas tamb?m no resto do mundo, incluindo o Brasil -, ? algo incomum. Mesmo nos filmes e romances de a??o, suspense e aventura mais extraordin?rios.
Acusado de violentar uma camareira de luxuoso hotel novaiorquino, o homem mais temido dos pa?ses em crise financeira em busca de b?ia de salva??o - Portugal e Gr?cia, por exemplo - recebeu voz de pris?o. Algemado, o pol?tico do Partido Socialista da Fran?a - nome preferencial das pesquisas para a sucess?o de Sarkozy na elei??o presidencial do ano que vem - foi retirado do avi?o e apresentado a uma ju?za, que o mandou para a cadeia, diante de ind?cios robustos apresentados pela pol?cia.
Mas o salto do diretor do FMI do para?so para o inferno estava apenas come?ando. Strauss-Kahn, que deveria participar na segunda-feira de uma reuni?o em Bruxelas, com ministros da Uni?o Europeia (UE), sobre a poss?vel reestrutura??o da d?vida grega, foi mandado pela ju?za para o pres?dio de Rikers Islanda, n?o antes de ter sido formalmente acusado de sete crimes de car?ter sexual.
Se condenado pela r?gida e implac?vel lei americana em casos do tipo, o agora ex-diretor do FMI poder? ficar mais de 70 anos na pris?o, se tiver tempo de vida suficiente para isso, obviamente. Quinta-feira, um dia antes do previsto, a justi?a formalizou a acusa??o contra Dominique, para que ele responda nos Estados Unidos pelos crimes que lhe s?o imputados. Mas, mediante pagamento de fian?a, milion?ria, permitiu que ele responda em liberdade. Com um policial permanentemente de plant?o na porta do apartamento onde ficar? em NY, al?m de um dispositivo eletr?nico amarrado no calcanhar, para que possa ser localizado em caso de tentativa de fuga.
Mesmo com a pol?cia e a justi?a fazendo t?o r?pido a sua parte, ainda ? cedo para o desfecho do caso com tudo para virar em um dos mais rumorosos confrontos judiciais deste s?culo em curso, al?m de desnudante e implac?vel embate de m?dia, envolvendo ve?culos de comunica??o norte-americanos e franceses.
Agora, trocando de caso, mas sem sair do assunto, uma pausa para r?pido olhar e reflex?o sobre o Brasil.
Em S?o Paulo, mais importante capital brasileira, vigoroso tambor de resson?ncia pol?tica, financeira e social do pa?s - para o bem e para o mal - o m?dico Roger Abdelmassih foi preso pela primeira vez em 17 de agosto de 2009, acusado de ataques sexuais a 57 mulheres, pacientes internadas em sua cl?nica, uma das mais badaladas e caras na ?rea de reprodu??o humana.
Em um dos maiores esc?ndalos da medicina, da m?dia e da justi?a, o m?dico teve pris?o preventiva decretada depois que as v?timas afirmaram ter sofrido ataques sexuais durante consultas. Os crimes haviam sido denunciados pela primeira vez ao Minist?rio P?blico em abril de 2008, por uma ex-funcion?ria do m?dico.
Poupo os leitores de detalhes escabrosos do caso, porque o relevante aqui ? lembrar que em agosto de 2008 - tr?s meses depois -, Abdelmassih foi intimado pelo Minist?rio P?blico a depor, mas n?o compareceu, e, a partir da?, o caminho da impunidade, ao contr?rio do que acontece agora com Strauss-Kahn, foi sendo alargado com o passar do tempo.
Resumo: Julgado e condenado, ? revelia, a 278 anos de pris?o por crimes sexuais, o m?dico est? foragido da Justi?a desde janeiro deste ano. Abdelmassih ? acusado agora de crimes ainda mais terr?veis: ter gerado beb?s com espermatoz?ides de outros homens e de ter vendido ?vulos de outras mulheres a pacientes que queriam engravidar. E segue a roda brasileira, com o tempo a servi?o do crime e da impunidade.
Para concluir o texto sobre hist?rias exemplares no Brasil e nos Estados Unidos, um coment?rio postado no Bahia em Pauta (blog que edito em Salvador) pela jornalista baiana Rosene Santana, que levou tr?s anos estudando em Harvard e conhece como poucas a realidade de l? e de c?:
"Por tr?s da not?cia (da pris?o do diretor do FMI), um detalhe que n?o pode escapar. Camareira de origem africana denuncia um figur?o por estupro e a pol?cia tira o figur?o de dentro de um v?o da Air France. S? mesmo nos EUA. Imaginem uma cena dessas em hotel de luxo em Salvador... A camareira, seguramente, seria chamada de prostituta, a pol?cia a amea?aria, a acusaria de fraude e o figur?o estaria em Paris posando de civilizado. Em S?o Paulo, Rio, Belo Horizonte, Argentina, Uruguai, Chile etc e etc, abaixo do Golfo do M?xico a coisa n?o seria diferente. At? quando?", pergunta Rosane.
Responda quem souber.
Fale com Vitor Hugo Soares: vitor_soares1@terra.com.br Opini?es expressas aqui s?o de exclusiva responsabilidade do autor e n?o necessariamente est?o de acordo com os par?metros editoriais de Terra Magazine.
